Hoje, uma conversa sobre um tema diferente
O mercado literário brasileiro cresceu, autoras e autores novos ganharam espaço em editoras comerciais, motivos de sobra para comemoração. Mas e quem segue na luta sem receber o devido reconhecimento?
Diversos acontecimentos (ou gatilhos, se você preferir um termo atual) me fizeram pensar no tema de hoje. O mais recente foi um post do autor André Timm anunciando que deixará de escrever. Em seu Instagram, Timm fala que seu romance mais recente será o último. Autor experiente, premiado, Timm traz, em sua produção, temas atuais e personagens muito conectados com questões contemporâneas.
Timm, como eu, Cris Vázquez, Matheus Borges, Tiago Germano, Larissa Brasil, Roberto Menezes, Daniel Gruber, Ana Luiza Rizzo, Bruno Ribeiro, Verena Cavalcante, Sinara Foss, Eduardo Sabino, Andréa Berriell, Juliana Cunha, e tantos outros, iniciamos nossa caminhada como autores independentes. Alguns despontaram, outros tantos seguem no caminho dos independentes.
E o que seria despontar quando se fala de um mercado literário bem restrito como é o brasileiro?
Despontar, neste caso específico, seria assinar contrato com uma editora comercial. Todo mundo quer, todo mundo sonha. Não é questão de ego, mas de distribuição. Somos cascudos, conhecemos as dificuldades das editoras independentes: falta de espaço nas grandes mídias, nos eventos literários, falta dinheiro para distribuir, relação conflituosa com livrarias, com autores.
Ser editor/autor independente é um trabalho de puro amor à literatura. É um corre danado: post, post, compartilhamento, post, post, aceita convite, corre, escreve, entrega, fala, faz, faz, faz mil coisas e, por fim, recebe crítica de overposting.
Publicar numa editora comercial reduz um tantão esse trabalho hercúleo de se autopromover.
O segundo gatilho que me fez escrever esse post foram duas entrevistas que assisti recentemente: a do autor/editor Antônio Xerxenesky para o ótimo Charla Literária e a dos autores Amanda Orlando e Cristhiano Aguiar para o podcast da PublishNews. Nas duas conversas fica claro que para alcançar o interesse de uma editora comercial você precisa ser representado por um agente literário.
Bom, devo dizer que chegamos a nova encruzilhada.
“Não é você que se candidata, é a agência que te escolhe”, ouvi alguns anos atrás quando pensei em procurar o serviço.
“Eu literalmente corri atrás de uma agente na Bienal”, ouvi de uma autora com obra sólida e público fiel. O jogging não gerou frutos. Apesar de ter muitas características que uma editora comercial se interessaria, a autora em questão segue independente e não agenciada.
“Eu insisti horrores para entrar (no seleto grupo de agenciados). Foi só quando venci três prêmios que a agente veio atrás”, ouvi de outro ator com obra e público inquestionável.
Cerca de duas semanas atrás, devido a um caso fora da curva, o assunto gerou discussão interessante no bate-papo do coletivo Nídaba.
Quais os critérios? Alguém brincou citando critérios maçônicos.
Por outro lado, sabemos, existem critérios referentes ao mercado (sempre o mercado). Em outra conversa com meu amigo e parceiro de Escuro Medo, Daniel Gruber, ele esclareceu que muitos agentes já trabalharam como editores, conhecem o mercado literário. Sabem em quais personalidades apostar. Isso, é claro, pode passar bem perto ou bem longe de critérios que eu, você ou sua tia que se emociona ao ler a poesia de Szymborska não concordamos. Porque também leva em conta o retorno financeiro.
Agenciados aparecem nos jornalões, nas listas de indicados, de melhores do ano, são convidados para entrevistas, para feiras. Quem não quer mais oportunidades de divulgar seu livro?
O fato é que naquela tarde, na conversa com o Nídaba, concluímos que o foco (já que nenhuma ali é agenciada) é fortalecer o trabalho enquanto coletivo. O legítimo “uma puxa a outra” ampliado para uma rede de apoio que dê suporte e divulgue a autora que resolveu publicar sua obra.
Terminamos a tarde alegres, motivadas.
Espero que o autor André Timm repense sua decisão. Que seu amor por criar seja mais intenso que a vontade de desistir.
E que os coletivos se fortaleçam cada vez mais. Tem muita gente talentosa publicando de forma independente (dizer isso é chover no molhado, mas eu queria usar o clichê de linguagem).
Vou terminar com Stephen King, que nos ensina que no horror, depois que a gente enxerga a cara do monstro ele deixa de ser tão temível.
Me sinto plenamente representado nesse texto. Eu desisti de fazer mil coisas pq tava me fazendo mal, respirei fundo e tô esperando as coisas acontecerem, mesmo que nunca aconteçam
Eu achei perfeita. Rápida e certeira. Tua crônica. Amei.